quarta-feira, 10 de maio de 2017
Não sou uma dessas garotas que imaginam coisas.
Quando Winner voltou para casa já passava da meia-noite. Mr. Green ofereceu-se para levá-lo de limousine, mas Winner não queria que ele visse onde estava morando ---- um pardieiro cor de tijolo entre a Terceira e a Segunda Avenida, com uma tabuleta pendurada na porta : QUARTOS PARA ALUGAR . Winner passara as duas últimas semanas no limbo. Aquele quarto bagunçado sem fechadura na porta, e cuja única sala dava a impressão de terem vivido nela milhares de pessoas, em mil épocas diferentes, deixando atrás de si montes e montes de pilhas de revistas Vogue e Harper´s Bazaar e aqueles autênticos penicos de vidro cor de fumo espalhados por toda parte, cheios de pontas de cigarro, de bocados de lápis e de cordel e de cascas de frutas ,tudo aquilo era pura decadência. Winner fora fagocitado pela sordidez daquele lugar, pensando que em breve sairia dali. ''No momento '', ele pensava ''ELE É PERFEITO ''. Winner tinha portado-se como convinha na casa dos Green. Mr. Green nem sequer pescara suas reais intenções . Antes pelo contrário. Mas foi para ''casa'', de todo modo. Diante da porta de seu alojamento viu estacionado um carro bem grande, todo reluzente, dirigido por um chofer uniformizado. Winner relanceou para o interior do veículo e teve a impressão de ver nele um senhor de idade envolto numa manta xadrez, muito parecido com M. Green. ''Essas aberrações estão em toda parte, agora '', Winner pensou, acendendo o cigarro nervosamente. ''Sempre as mesmas malditas histórias iniciadas em noites sombrias, com o mesmo nervosismo: mãos crispadas, olhares de esguelha... conheço bem isso, já escrevi mais de uma centena de livros assim ''. Deja vu : ''Terá sido assim tb, que ELA, tolamente, jogando cartas ou empreendendo grandes negócios, se deixou arrastar até a América (? ) ----- sempre a mesma história : ''SOU APENAS UMA GAROTA... TALVEZ VC CAÇOE DE MIM (ela disse para Winner , no navio ) '' . Todos sempre tem tanta certeza que vão ser caçoados, Winner pensava. Pensam que seus casos particulares são de tal modo incríveis que pessoa alguma seria capaz de compreendê-los. ELA CONTINUOU : ''Meu nome é... Albertine Rivebelle. Meu pai é o investidor bilionário... Napoleon Rivebelle. '' . E daí, Winner resmungou consigo. A garota falava como o mundo inteiro girasse em torno de Napoelon Rivebelle.
''Napoleon Rivebele '', continuou ela '' de Nova York . Ele aparece com frequencia nos jornais. É muito rico e poderoso na América, no mundo, perdoe se parece pretensão minha, mas é necessário para que compreenda... '' .
E Albertine passou a contar uma história detalhada para um Winner que bocejava naquele navio, pensando nas suas cartas e entrando fundo nos drinks. Um gato esfregava-se nas suas pernas.
''Meu pai e eu não somos como os outros pais e filhas... ele só tem a mim no mundo. Sou a única pessoa por quem ela realmente se interessa.Apesar dos seus negócios, ele me escreve todas as semanas um longo e-mail. E todos os anos, na época das férias, passamos juntos duas ou tres semanas na Itália, na Grécia, na Índia, na Indonésia... Eu trouxe algumas cartas dele para que voce compreenda. Só entrei nesse navio por que fui informada pelo meu detetive particular de que você estaria nele '' ela disse.
Winner pegou uma das cartas e levou bem perto dos olhos.
''MINHA QUERIDA... '' ,começava a carta. O tom era quase o utilizado para se dirigir à mulher amada. O papai da América se preocupava com tudo : saúde dos filhos, as horas de sono dela, suas saídas à noite, seu humor, seus projetos profissionais, seus sonhos.E alegrava-se com a proximidade do próximo encontra com a filha predileta.
''Gostaria de convencer o Sr. , Sr. Winner, de que não sou uma dessas garotas nervosas, que ficam imaginando coisas no quarto... Há seis meses algo muito grave vem acontecendo. Não sei do que se trata, mas tenho certeza de que... Sinto que meu pai está ficando com muito medo. Ele simplesmente não é mais o mesmo. Ele vive agora sob a consciência pesada de que um perigo pende sobre sua cabeça. E talvez não só sobre a sua... '', concluiu ela.
K.M.
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