domingo, 14 de maio de 2017
FELIZ DIA DAS MÃES !
''O difícil é começar... o resto vem depois '', pensou Mathieu, mascando cadenciadamente seu chiclete. Sábado e Domingo ele tinha andado vagando por uma feira de livros perto de sua casa, no Harlem ---- uma porção de quiosques com enorme quantidade de títulos. ''Existem livros sobre qualquer assunto '', Mathieu pensou. Mathieu nunca tinha gostado muito de ler, por isso aproveitou aquela feira para ler o maior número de páginas gratuitas que conseguisse. Passou quatro dias andando de um quiosque para o outro, lendo trechos de centenas de livros. Quando a feira terminou, Mathieu trocou o chiclete na boca, e pensou : ''Quero escrever um livro ''. De fato, desde então, ele nunca mais pensou em outra coisa. ''Apenas comece '', Mathieu repetia consigo acreditando ser uma coisa simples, quanto qualquer verdade. ''Vou começar pelo título '', ele pensou. ''Sem ele realmente o livro não adquire o sopro inicial de vida necessário ao seu desenvolvimento.
Mathieu ficou horas diante do papel, olhando para o título que tinha inventado :
''O ARGENTÁRIO''.
''Era uma vez...'', iniciou então Mathieu sua ''escritura''. Num daqueles livros da feira, Mathieu havia, humildemente, lido o livro de um filósofo que afirmava, de maneira surpreendente para Mathieu, um gângster da Arraia Graúda das Finanças , que escrever era CONTAMINAR , causar uma INFECÇÃO, CORROMPER, VICIAR , e era exatamente o que Mathieu almejava, com seu livro. Por falta de costume, Mathieu desenvolveu um certo medo das metáforas.
O ARGENTÁRIO.
''Era um banqueiro rico e poderoso, o dinheiro dava-lhe autoridade, abria-lhe todas as portas, conseguia-lhe mulheres e mesuras, e , quanto mais dinheiro possuía, maiores eram sua influência, prestígio e poder junto aos seus pares e sobre a legião e subordinados que lhe prestava vassalagem ''.
Interrompeu-se Mathieu, mascando o chiclete. Pensou em Mac Donald. Continuou:
''A ninguém interessava como ele obtivera seus vastos recursos financeiros, parte deles certamente de maneira ilícita e imoral , afinal, ELE ERA UM BANQUEIRO. O dinheiro dá uma aura de respeitabilidade, além de um irresistível charme, a ladrões, rufiões, putas, traficantes, matadores de aluguel, gângsters, assaltantes, estelionatários e corruptos de uma maneira geral''.
Mathieu sabia o que estava escrevendo. Só conseguia escrever sobre o ''seu mundo''.
''Até que esse começo não está uma merda tão grande quanto o anterior'', Mathieu pensou. ''Mas ainda tenho dúvidas... nunca fui muito de ler, nem de escrever. Misturar pedófilos e assassinos com putas, estelionatários e corruptos, é meio arbitrário, não obstante a atração pelo dinheiro ter a mesma essência do pendor pela depravação. Além disso, falar de banqueiros é um velho clichê,todas aquelas revistas chatas de economia fazem isso.
(...)
''Não'', pensava ainda Mathieu '' minha indecisão nada tem a ver com ofato de eu estar devendo dinheiro no banco, mesmo sendo esse um bom motivo para ir à fora dos juros escorchantes que me cobram . Não sei porque atribuí um ''charme'' ao banqueiro do meu livro. Um banqueiro, mesmo que tenha um passado deslumbrante de fraudes e tramóias, fraudes e trapaças, como a maioria, a partir do momento em que a máscara que usa é a do '' banqueiro'' e ess a máscara vira sua verdadeira face, como todas as máscaras que não se tiram do rosto, ele se torna uma sujeito sem charme '' .
O chiclete fazia um barulho líquido na boca de Mathieu.
''Estou usando um computador que comprei com dinheiro financiado por um banco. É claro, não tenho dinheiro sobrando, e parece que o computador não está me ajudando muito , não tanto quanto eu pensava'', Mathieu sentia que, desde a noite em que a Srta. Albertine Rivebelle tinha elogiado um de seus serviços, nunca tinha pensado tanto na vida.Mathieu se admirava com a quantidade de palavras novas que apareciam espontaneamente no seu vocabulário agora. Fizera bem em percorrer aqueles quiosques, atirando os livros lidos pela metade de volta para os cestos e caixas de papelão..
Lendo novamente o parágrafo que começara a história do banqueiro, Mathieu não teve dúvidas de que tbm estava uma droga.
''Vou abandonar este começo '' Mathieu pensou finalmente '' Mas não desisto, ESCREVER É COMEÇAR.
E agora Mathieu estava mais motivado. Mascava o chiclete cada vez mais velozmente, exatamente como quando estava perto de solucionar algum ''caso'' importante de um instante para o outro.
''Começa-se pelo título '', Mathieu pensou, e escreveu :
OS SERES HUMANOS NÃO MERECEM EXISTIR.
''Gostava de matar baratas '' começou Mathieu '' ... pisando-as com a sola do sapato , mas um dia, depois de matar uma barata, o seu pensamento começou a vagar de maneira descontrolada e inquieta. Ele queria ser um escritor. Ele quem ? Mathieu, era seu nome. Ainda que Mathieu soubesse que cada vez mais livros são publicado e menos livros são lidos, e que se conseguisse publicar um livro a crítica não tomaria conhecimento de seu trabalho, os críticos só se interessam pelos livros que vendem , por best-sellers totalmente cretinos. Mas Mathieu não ia desistir de seu propósito, apesar da inquietação que se apoderou dele, do descontrole do seu pensamento e do seu chiclete, nesse dia em que ele matou a barata. claro que um escritor necessito de um certo domínio sobre seus pensamentos, deve possuir o poder de dirigi-los no sentido que desejar ; e se isso não for totalmente possível o escritor não tem motivo para ficar preocupado , precisa apenas dar um certo método às suas divagações, mesmo se essas digressões o levem a se perguntar:
''MAS PORQUE MATAR APENAS BARATAS ?''
''PORQUE NÃO MATAR GENTE ?''
Matheiu sentiu-se subitamente iluminado. Agora escrevia sobre um assunto de que realmente entendia. O chiclete saltava dentro de sua boca como um coração explodindo de inspiração.
''Gosto desse novo começo '' , Mathieu pensou.. Ele não sabia mais se estava pensando ou escrevendo, o bloqueio criativo tinha cedido definitivamente. Continuou:
''Não consigo acabar com as baratas que me perseguem, dedetizo periodicamente minha casa mas elas descem do apartamento de cima, onde mora uma velha suja e impetulante . Ontem ela disse , SAI DA MINHA FRENTE, BANDIDO , quando me encontrou na escada. A velha desgraçada subia os degraus com mais rapidez que eu . Dei passagem à ela sentindo vontade de agarrar seu pescoço pelancudo e exterminar naquele momento a sua vida inútil . Odeio baratas e antes as matava pisando nelas, mas hoje vou matá-las com as mãos , isso me dará uma satisfação especial, assim eu me vingo do nojo e do asco e do medo que me causaram. Corro atrás d a primeira barata que aparece na cozinha, e achato-a com um golpe forte, sinto a barata estalando e enchendo de gosma fedorenta a palma d a minha mão, que esfrego vitorioso no chão da cozinha. Meus pensamentos correm como ferozes tigres famintos perseguindo gazelas assustadas numa infindável pradaria.
''Não vou passar o resto dos meus dias matando baratas. '', pensa, e escreve Mathieu.
Então, sobe ao sexto andar. Quando a velha abre a porta , eu entro e a agarro pelo pescoço, esganando-a. Ainda não sei como escrever o que sinto . Pego alguns objetos na casa para parecer que a velha foi morta por um ladrão. Ao sair, deixo a porta aberta, um vizinho qualquer logo descobrirá o cadáver dela. Ninguém suspeitará de mim. Sou conhecido como o introspectivo mascador de chiclete do térreo.
''Neste momento, estou desenvolvendo o começo da história que iniciei com o título que lhe deu o sopro inicial de vida'', escreveu Mathieu .
No quiosques de livros da praça ele havia lido um poema no qual o autor (roubei dele o título da minha obra) diz que o mundo é ''doloroso'' , OS SERES HUMANOS NÃO MERECEM EXISTE e ele , POETA , suspeita que a crueldade de sua imaginação está de certa forma conectada com seus impulsos criativos. Matar a velha, não a crueldade, como disse o poeta, MAS A FORÇA DO MEU ATO E NÃO APENAS DA MINHA IMAGINAÇÃO FOI A IMPULSÃO QUE FARÁ DE MIM UM VERDADEIRO ESCRITOR.
''Escreve com sangue, pois o sangue é espírito'', escreveu Nietszche.
Mathieu quase setenta páginas de Ecce Homo.
''Livre-se de sua vidinha'', escrevera ele sobre o índice do livro.
Mas o escritor nao pode, nem deve, livrar-se de sua vida.
ESCREVER É COMEÇAR.
''Tenho agora '', escreveu Mathieu '' o COMEÇO , tenho o MEIO e tenho o FIM
K.M.
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