quarta-feira, 10 de maio de 2017
''Tem amigos em Nova York, Mr. Winner ?''
Assim que acordou , Winner nem sequer telefonou para o Dr. Lawrence. Foi direto para o edifício na Quinta Avenida . Lá, deixaram-no mofando um bom quarto de hora. Furioso novamente, Winner fumava seus cigarros um atrás do outro, mesmo percebendo não estar no local adequado. Um funcionário do edifício, tbm um hotel , acompanhou-o ao elevador, conduziu-o ao longo de um corredor, bateu à porta e rapidamente abandonou-o.
''Entre ! "'
Winner se perguntava por que teria imaginado o secretário do Sr. Rivibelle, Mac Donald, como um homem de meia-idade e ar severo .. Era apenas um rapaz alto e extrovertido, alinhado, que se adiantou na sua direção com a mão estendida.
''Perdão , mas Mr. Rivibelle é tão procurado por tantos solicitantes diferentes a todo instante que somos obrigados à erguer`a sua volta uma verdadeira muralha. O Sr. disse que acaba de chegar da Europa. Presumo que seja o ex-namorado da Srta. Albertine Rivibelle. Bem .. '', disse Mac Donald.
''Compreendo '', Winner disse, sem querer tirar partido do destino.
''Sente-se, por favor '', convidou Mac Donald.
Haviam diversas caixas sobre um móvel bonito. A sala era ampla, um salão bem iluminado e arejado que a imensa escrivaninha de acaju transformava, sem porém dar ao ambiente o ar de um escritório. Winner, desdenhando o charuto Havana que Mac Donald lhe ofereceu, acendeu um de seus cigarros e examinou o interlocutor sem nenhuma benevolência.
''O Sr. traz realmente notícias da Srta. Albertine, como escreveu no bilhete ? '' , perguntou Mac Donald.
''Se me permite, falarei sobre o assunto pessoalmente com o Sr. Rivibelle. Quando, e se, me apresentar à ele.. ''.
...
Mac Donald mostrou os dentes para Winner. Eram tão brancos, que Winner sentiu ânsia de vômito.
''Vê-se que o Sr. acaba mesmo de chegar da Europa '', Mac Donald disse, rindo do penteado de Winner. ''Do contrário, saberia que Mr. Rivibelle é um dos homens mais ocupados de Nova York, que nesse instante nem mesmo eu seu do seu paradeiro, e, finalmente, que estou encarregado de todos os seus negócios. Eu, e não o Dr. Lawrence. Inclusive os de caráter pessoal... Pode falar sem medo e dizer... ''.
''Esperarei até que Mr. Rivibelle esteja disposto a me receber '', disse Winner.
''Ele precisaria saber do que se trata ''.
''Já disse : da filha dele ''.
''Sinceramente... devo crer, em vista da''fama '' do Sr. , que o Sr. deve ter cometido alguma tolice com a garota ? '', insinuou Mac Donald.
Winner não se moveu. Não respondeu e continuou examinando friamente seu interlocutor.
''Perdoe se insisto, Mr. Winner. Suponho que, embora esteja num momento de transição da sua ''obra '', pelo que pude ler nos jornais, continuam à chamá-lo assim ? Enfant Terrible ? Perdoe, repito, eu observar mais uma vez que estamos nos Estados Unidos, não na França , e que os minutos de Mr. Rivibelle aqui são não só contados, como precificados. A Srta. Albertine é uma moça muito simpática, inteligente, culta, mas talvez possua uma sensibilidade exagerada para certos aspectos da vida. Eu me pergunto simplesmente o que poderia... '', interrompeu-se Mac Donald.
''Quando Mr. Rivibelle se decidir a me receber, eu me hospedarei aqui, nesse hotel. '', disse Winner.
''Mas Mr. Rivibelle não estará de volta à Nova York antes de 15 dias''
''Onde ele se encontra no momento '', perguntou Winner, inalterável.
''É difícil dizer. Onteontem estava no Panamá. Hoje pode estar n Rio de Janeiro. Em Tokyo. No Chile. ''
''Obrigado''.
''Tem amigos em Nova York, Mr. Winner ?''
''Não, mas sou conhecido pelos chefes da polícia da cidade ''.
''Permite que eu convide o Sr. para um almoço ?''.
'' Creio que prefiro almoçar sozinho''.
''E se eu insistir ??'' , grunhiu Mac Donald.
Winner acendeu outro cigarro.
''Então terei que transformar vossa doutrina em sabedoria , e extrair uma metástase dos movimentos emotivos do vosso espírito'' , disse Winner.
''A doutrina do sensíveis '' , Mac Donald disse, rindo ironicamente ''desfaz-se em pó diante da sensatez dos insensíveis ?''
''Nonsense, apenas. Mas não devemos chama-la de incapacitada para a vida '', ponderou Winner, devolvendo o sorriso.
Alguém caminhava no cômodo ao lado. Winner percebeu que o rosto de Mac Donald ficou subitamente branco de apreensão. Mac Donald escutava ansiosamente os passos que se aproximavam . Os olhos injetados na maçaneta da porta. A maçaneta dourada da porta de comunicação. Ela girou lentamente. Uma pequena fresta se abriu.
''Venha cá um instante, Happy Meal ''.
Um rosto nervoso, sob cabelos ainda loiros, e um olhar que imediatamente fixou Winner, franzindo a testa, dominaram a paisagem da sala.
''Parece-me ... '' , falou o o homem, como quando se julga reconhecer algupem .
''Mr. Winner, o escritor aposentado ''.
Napoleon Rivibelle era alto, de estatura superior à mediana, e sugeria um ser enérgico.
''É comigo que o Sr. deseja falar, Mr winner ?''
E voltando para Mac Donald, sem esperar a resposta :
''Do que se trata, Mac ?''
''Não sei, chefe ''.
''Gostaria de lhe falar a sós, Mr. Rivibelle , É sobre a sua filha''.
Nem por um instante a fisionomia do velho homem que escrevia cartas tão alarmadas e carinhosas nos últimos tempos estremeceu.
''Pode falar diante dele, é meu homem de confiança '', disse Rivibelle.
''Muito bem, sua filha está em Nova York '', disse Winner.
Winner não tirava os olhos dos dois. Perguntava-se se poderia estar enganado . Teve a nítida impressão de que Mac Donald sentira um choque, enquanto Rivibelle, pelo contrário , permanecera imperturbável , murmurando simplesmente.
''Ah ''
''O Sr. não está surpreso, certamente. Encontrei-me com o Dr . Lawrence''., disse Winner.
''O Sr. deveria saber '', advertiu Mr. Rivibelle '' que minha filha é , sem dúvida, uma pessoa muito livre ''.
''O Sr. não está aflito por ela ainda não ter vindo procurar o Sr (?) ''.
''Se ela chegou junto com o Sr. , Sr. Winner, mas que diabos ! O Sr deveria saber ... ''
''Não sei de nada ''contestou abruptamente Winner. ''justamente. Na confusão do desembarque e as formalidades , perdi-a de vista. Na última vez que a vi e que nos falamos, eu estava realmente bêbado. '', Winner disse.
''É provável que ela tenha encontrado amigos. Ou amigas... se me entende'', disse o velho, acendendo lentamente um comprido charuto marcado com suas próprias iniciais.
''Só amores guardei ao meu charuto ... '' , disse Winner.
''Lamento, Mr Winner, mas não vejo porque a chegada da minha filha... ''
''Minha visita certamente incomodou o Sr, certo ? '', perguntou Winner, vagamente.
''É mais ou menos o que eu estava pretendendo dizer '', retrucou o velho . ''Estou muito ocupado esta manhã. Se me permite, vou deixá-lo com meu secretário, a quem pode continuar falando com toda liberdade... Com vossa licença... '', disse, e saiu.
Um cumprimento bastante seco. Dando meia volta, Rivibelle desapareceu por onde havia entrado. Mas Mac Donald hesitou um instante e murmurou :
''Com licença... ''.
E saiu no encalço do chefe, fechando a porta. Winner ficou sozinho na sala . Não conseguia sentir-se orgulhoso de si. Ouvia os cochichos no cômodo contíguo. Estava para sair furioso dali, quando Mac Donald reapareceu, alerta e sorridente.
''Como o Sr. vê, não havia por que desconfiar de mim '' , disse ele.
''Pensei que Mr. Rivibelle estivesse no Rio de Janeiro . Ou em Val Paradiso. '' , provocou Winner.
Mac Donald riu.
''Será que em seis meses vivendo no Quai des Orfèvres, onde o Sr. tinha aquelas ''pesadas responsabilidades'', nunca lhe ocorreu contar uma mentirinha de vez em quando, para se livrar de um visitinha indesejada ? ''
''Agradeço por pagar-me na mesma moeda ''., disse Winner.
''Não me guarde rancor '', disse Mac Donald.
K.M.
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