quinta-feira, 11 de maio de 2017
''Entendo. O Sr. não é exatamente um ''filósofo ''
Aquele homem era uma espécie de gênio benfazejo ? Na 49 St. , a poucos passos das luzes e agitação da Broadway, aquele homem empurrara uma porta, depois de descer alguns degraus, como que para mergulhar num poço. No vidro da porta já se via uma cortina xadrez vermelho. Aquele mesmo axadrezado democrático (Winner pensava ) que lhe lembrava tanto os bistrôs de Montmartre e da periferia parisiense., cobria a mesa ; havia tbm o balcão, um cheiro de comida conhecida, e a dona do restaurante, aproximando-se deles para indagar :
''Que desejam, rapazes ? ''
O demiurgo, ou melhor, o Capitão Reddington sorriu um sorriso tímido.
''Está vendo ? '', disse para Winner, irônico ''Nova York não é bem o que se imagina''.
E daí a instantes havia na mesa um autêntico Beajolais acompanhado exatamente por.. coq au vin, que fumegava nos pratos.
''Não vai me dizer, Capitão, que os americanos tem por hábito... ''
''De se alimentar como nós ? Não todos os dias. Ainda restam o que não desprezaram totalmente a velha cozinha. Há muitos restaurantes desse tipo por aqui. O Sr. está aqui há quase vinte dias e já se sente em casa, certo ? Agora, continue aquela sua história '' , sugeriu o Capitão.
''Esse Mac Donald, como eu ia dizendo, me esperava ontem no bar do Edifício Rivibelle. então, compreendi imediatamente que ele tinha decidido mudar de atitude em relação à mim '', disse Winner.
Winner só conseguira telefonar para o Capitão Reddington, do FBI , às seis horas. Os dois haviam se conhecido na França, anos antes, por ocasião de um evento policial.
O Capitão falava devagar. Era alto, branco e não muito atlético. Possuía uma timidez que ainda o permitia corar aos 50 anos. Assim que Winner lhe falara de Mac Donald, o Capitão perguntou pelo encontro.
''Um punhado de homens no balcão, alguns casais em mesas envoltas numa penumbra high-tech e uma detestável música lounge'', disse Winner.
''Qual o problema, Mr Winner ? Não gosta de música?''.
Winner ainda não tivera tempo de manifestar todo seu mau humor naquela tarde, e não foi capaz de dissimulá-lo.
''Não pretendo chateá-lo , Mr. Winner '', disse o Capitão ''Perdão, não sou muito bom em matemática '', e riu.
''Sabe para onde vão os nickels que enfiamos em caixas de música daqui e de todo o interior dos Estados Unidos ? '', sempre aquele tom de ironia, Winner era uma esfinge.
''Entendi. Para Mr. Napoleon Rivibelle.. vamos pular essa parte. O homem possui uma espécie de monopólio, aqui e numa cesta de repúblicas sul-americanas e asiáticas. Todo mundo conhece seus negócios. Compreende sua importância ?'', disse o Capitão.
Winner desabituara-se àquilo, e perguntava-se, desconfiado, se seu interlocutor era um ingênuo ou estava zombando dele.
''Conte-me o resto da história '', solicitou o Capitão, servindo-se mais do prato.
Estavam sentados à mesa, bem aquecidos, enquanto lá fora o vento soprava em rajadas tão fortes que os transeuntes caminhavam curvados para a frente ; alguns corriam at´ras de seus esvoaçantes pertences, e as mulheres seguravam seus vestidos com ambas as mãos. A tempestade, sem dúvida a mesma que Winner enfrentara no mar, chegara agora à costa e sacudia Nova York; letreiros desabavam a intervalos, coisas tombavam do alto dos prédios, e até os táxis amarelos encontravam dificuldade para contrariar o vento. A tempestade desabara pouco antes da refeição.
''Conhece bem o secretário de Mr. Rivibelle ?'' , Winner perguntou para o Capitão.
''Não muito. Meu caro Winner, os federais aqui não são como na França...Infelizmente, já que isso facilitaria muito nossa tarefa.. Aqui temos um profundo sentimento de liberdade individual, e se eu me permitisse informar, mesmo que discretamente, sobre um cidadão americano a quem nada eu (e o Estado) têm a censurar, eu me meteria em complicações '', disse o Capitão.
Winner acendeu um cigarro. Novamente, ele fumava em local proibido.
''Entendo. O Sr. não é exatamente um ''filósofo '' . Winner disse, voltando a encontrar uma disposição favorável dentro de si.
''Mr. Rivibelle , já o digo logo de cara, não é um gângster '' , disse o Capitão, sério ''É um homem de negócios exemplar, respeitado na imprensa do mundo todo, que mora o ano inteiro numa suntuosa cobertura do R. B. , que é tbm um dos grandes hotéis da cidade. Nada temos a ver, portanto, com ele ou seu secretário.. ''.
''Mac Donald pareceu-me ter origem francesa tbm'', disse Winner.
''É muito difícil , em NovaYork, distinguir a origem exata das pessoas '' disse o Capitão, cada vez mais defensivo.
''Como eu ia dizendo, no encontro de ontem Mac Donald fez muita questão de mostrar-se atencioso comigo, tão atencioso quanto havia sido grosso de manhã '' continuou Winner ''Anunciou-me que continuavam sem notícias da Srta. Albertine Rivibelle, masque o pai dela ainda não estava realmente preocupado, atribuindo o desaparecimento dela à alguma ''amiga '' . Ele me interrogou um pouco a respeito dos passageiros do navio ''.
"'O que voce disse à ele ? '', interrogou o Capitão.
''Disse que não estava em condições de me lembrar com certeza, mas com algum esforço desanuviei uma outra passageira, uma moça chilena que devia desembarcar junto conosco ou coisa assim'' .
A dona do restaurante ia de mesa em mesa, com familiaridade um tanto vulgar, perguntando com um saboroso sotaque de Tolouse:
''Que tal, rapazes ? Mais coq au vin ? E depois, se o coração pedir, há um bolo de café feito aqui na própria casa'' .
Mas o almoço, Winner lembrava-se, fora bem diferente no salão do bar do hotel Rivibelle, onde Mac Donald cumprimentava todo mundo que aprecia no caminho. E ao mesmo tempo mostrava-se bastante atencioso com Winner, a quem não parava de falar um minuto sequer.
''Mr. Rivibelle é um homem muito ocupado, Mr. Winner. Compreenda que se trata de um homem exemplar, e de um exemplar bastante original no mundo dos negócios : UM HOMEM COM HORROR DE CARAS NOVAS. DESCONFIADO DE TUDO E DE TODOS '' , disse Mac Donald.
E porque não se surpreendera ao ver naquela manhã no seu ''apartamento'' uma pessoa como Winner ?
''Ele não gosta que se intrometam nos seus assuntos. Principalmente nos negócios de família. Adora a filha, esteja certo disso.Mas ele nunca conversa a respeito com ninguém. Nem mesmo comigo'', continuou Mac Donald.
Onde aquele sujeito queria chegar, perguntava-se Winner então.
''Fácil advinhar '', disse o Capitão , interrompendo as recordações de Winner ''Ele evidentemente queria saber porque diabos voce atravessara o Atlântico na companhia da garota ''.
''Mac Donald disse ainda '', continuou Winner, apreciando a intervenção do Capitão Reddington ''que tivera uma longa conversa com seu chefe, e ele encarregara-o pessoalmente de investigar o paradeiro da filha. Então revelou que tinha um encontro marcado, dali a instantes, com um detetive particular, um (segundo ele ) ''homem extraordinário '', que já trabalhara para eles em outros casos e que conhecia Nova York melhor do que eu conhecia Paris. ''SE QUISER ''disse Mac Donald ''PODERÁ NOS ACOMPANHAR. FICAREI ADMIRADO SE ATÉ SEXTA-FEIRA À NOITE NÃO TIVERMOS ENCONTRADO A SRTA . RIVIBELLE ''.
Tudo isso Winner contou ao Capitão Reddington , que escutava-o saboreando o ors au vin com uma lentidão exasperadora.
''Um homem realmente nos esperava no saguão ,quando deixamos o bar do hotel '', continuou Winner.
''Qual era o nome dele ?'' .
''Só fiquei sabendo o primeiro nome : MATHIEU. Conheci ontem tanta gente que Mac Donald chamava pelo primeiro nome, que fiquei meio confuso '', disse Winner.
Sempre o mesmo sorriso o rosto do Capitão.
''Vai acabar se habituando. É um costume aqui, Como era esse Mathieu ? ''
''Bastante alto e forte, mais ou menos minha estatura. Nariz quebrado e uma cicatriz no queixo''
O Capitão devia conhece-lo, pois pestanejou de leve, mas nada disse...
No dia seguinte (sexta-feira ) Winner e o Capitão tomaram um táxi e foram se encontrar com Mathieu no cais das French Lines.
K.M.
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