Já tentei chamar a atenção para aquilo que permanece uma verdadeira ''terra incógnita '' em linguística, na poesia e na epistemologia (cuja análise aliás continua sendo mérito exclusivo de Husserl ). É a questão da fala interior ou do discurso que mantemos continuamente conosco. É um solilóquio que nunca é expresso; que na verdade abriga em si uma enorme massa de speech-acts e que excede largamente, em densidade e volume, a linguagem usada para a comunicação exterior. Sua articulação tbm se encontra sob constantes pressões formadoras ou inibitórias exercidas por circunstâncias históricas e sociais e pelo estatuto público de gramáticas e vocabulários, embora nada os impeça de serem enriquecidos pelo próprio exercício da mesma fala interior e seus elementos de um jargão pessoal . É perfeitamente possível que até recentemente, nas culturas ocidentais, o solilóquio tenha representado a eloquência que nunca foi ouvida, a poesia e o vitupério de incontáveis mulheres. Nossos verdadeiros familiares são os ''egos '' ou ouvintes espectrais aos quais endereçamos as correntes lexicais, gramaticais e semânticas de uma fala silenciosa. Nossa consciência, mesmo quando nossa audição interior e nossa capacidade de atenção continuam intermitentes, é constituída por um monólogo das inúmeras individuações cujos poderes criativos e cuja capacidade para gerar terror ou conforto ou introversão ou fantasia ainda não foram convenientemente analisados. A solidão ontológica do momento criativo e o ''autismo '' do poeta ou do artista , suspeita-se, são muito comuns. O ''outro '' , em cuja presença o escritor ou compositor trabalha, sempre foi, de tempos em tempos, um deus relativamente bem idealizado . É ele o CRIADOR , e o PATRONO da obra. O único juiz justo de tudo. E o juiz justo e o único crítico justo é tbm Dioniso-Cristo, que se orgulha, aprecia e admira os dons de sua própria criação mais que qualquer homem, e mais do que é capaz o próprio receptor. Testemunha qualificada de sua própria intenção e de sua própria habilidade; o crítico criador do próprio projeto; o partidário do ideal estético próprio para quem todo diálogo e rivalidade são dádivas de generosidade. Nesse caso, a influência não é mais especificamente uma forma de angústia, mas de colaboração, entregando seus convites a despeito de qualquer cronologia. No momento em que a compreendemos em seu estado original, orgânico, dionisíaco e xamânico, a arte passa a pulsar com anunciações. Há verdades mais poderosas por vir.
K.M.
A forma, a espécie, a lei, idéia, o fim --- em toda parte comete-se o mesmo erro ao substituir uma ficção por falsa realidade : como se o que acontece encerrasse obrigação de uma obediência qualquer, faz-se uma separação artificial entre o que ''age '' e o que ''de acordo com que '' a ação se dirige ( mas o ''que'' e o ''de acordo com que'' somente são fixados para obedecer à nossa dogmática metafísico-lógica ou coisa que o valha : Não são FATOS. Chega de interpretar a coação que nos impulsiona a formar conceitos, espécies, formas, fins e leis (um mundo de casos idênticos ) no sentido de que , por meio deles, estaríamos em condição de fixar o mundo-verdade pelo contrário, a necessidade de preparar para nosso uso um mundo onde ''nossa existência '' tornar-se-ia possível : criamos assim um mundo que é determinável, simplificado, compreensível para nós. A mesma coação subsiste na atividade dos sentidos que sustenta a inteligêcia, pela simplificação, aumento grosseiro acentuação e interpretação, sobre as quais repousa todo ''reconhecimento '', toda possibilidade de se tornar inteligível . Com tanta precisão ,as ''necessidades '' determinaram os sentidos que ''o próprio mundo das aparências '' reaparece sempre e toma assim o aspecto de realidade.
ResponderExcluirK.M.
A coação subjetiva que nos faz crer na lógica explica simplesmente que, bem antes de havermos tido consciência da lógica, não havíamos feito outra coisa senão introduzir seus postulados ''no que acontece'' : mas agora os encontramos no que acontece --- não podemos mais proceder de outra forma --- e nossa imaginação interpreta essa coação como uma ''garantia da verdade''. Fomos nós quem criamos a coisa... a coisa igual, o sujeito, o atributo , a ação, o objeto, a substância, a forma, depois de estarmos muito tempo satisfeito s em representá-los iguais, grosseiros e simples.
ResponderExcluirK.M.