Acredito profundamente no poder de algumas respostas encontradas nas investigações das tendências econômicas atuais de padrões de repetição e evolução que abarcam todo o curso do capitalismo histórico como sistema mundial . Uma vez que ampliamos dessa maneira o horizonte espaço-temporal de nossas observações e conjecturas teóricas , tendências que pareciam inéditas e imprevisíveis começam a afigurar-se familiares. Talvez o ponto de partida de todos aqueles que ,como eu, acreditam na operatividade desse método, seja a famosa afirmação de Fernand Braudel , de que as características essenciais do capitalismo histórico em sua '' longue durée '' foram a flexibilidade e o ecletismo do capital , e não as formas concretas assumidas por ele em diferentes lugares e épocas: ''Permitam-me enfatizar que aquilo que me parece ser um aspecto essencial da história geral do capitalismo : sua flexibilidade ilimitada, sua capacidade de mudança e de ''adaptação'' . Se há, segundo creio , uma certa unidade no capitalismo, da Itália do século XIII até o Ocidente atual , é aí , acima de tudo , que essa unidade pode ser situada e observada '' (F. Braudel ) .Em certos períodos, inclusive períodos longos, o capitalismo de fato pareceu ''especializar-se '' , como no ´século XIX , quando ''se deslocou tão espetacularmente para o novo mundo da indústria '' (idem ) . Essa especialização levou ''os historiadores em geral (...) a encararem a indústria como o desabrochamento final , que teria dado ao capitalismo sua ''verdadeira identidade '' . Mas essa se mostrou uma visão de curto prazo : ''Após a explosão inicial da mecanização, o tipo mais avançado de capitalismo retornou ao ecletismo ---- a um indivisibilidade de interesses ----- como se a típica vantagem de estar no alto comando da economia , tanto hoje quanto na época de Jacques Coeur (o magnata do século XIV) , consistisse precisamente em ''não'' ter que estar restrito a uma única opção, em ser eminentemente adaptável e, por conseguinte , não especializado. '' (Braudel )
K.M.
Parece-me que esses trechos podem ser lidos como uma reafirmação da fórmula de Marx para o capital : DMD . O capital-dinheiro D significa liquidez, flexibilidade e liberdade de escolha. O capital-mercadoria M é o capital investido numa dada combinação de insumo-produto, visando ao lucro ; portanto, significa concretude, rigidez e um estreitamento ou fechamento das opções. D representa a ''amplificação ' da liquidez, da flexibilidade e da liberdade de escolha .
ResponderExcluirJá continuo
A fórmula de Marx nos diz que não é como um fim em si que os agentes capitalistas investem dinheiro em combinações específicas de insumos-produtos, com perda concomitante da flexibilidade e da liberdade de escolha . Ao contrário , eles o fazem como um meio para chegar à finalidade de assegurar uma flexibilidade e liberdade de escolha ainda maiores num momento futuro . A fórmula tbm nos diz que , quando os agentes capitalistas não tem expectativa de aumentar sua própria liberdade de escolha , ou quando essa expectativa é sistematicamente frustrada, o capital tende a retornar a formas mais flexíveis de investimento --- acima de tudo, à sua forma monetária. Passam a preferir a liquidez, e uma parcela incomumente grande de seus recursos tende a permanecer sob forma líquida.
ResponderExcluirK.M.
Caracterização braudeliana da ''expansão ''financeira '' como um sintoma da maturidade de determinado desenvolvimento capitalista. Ao discutir fartamente a retirada dos holandeses do comércio em meados do século XVIII, para se transformarem nos ''Banqueiros da Europa '', Braudel sugere que essa retirada é uma tendência sistêmica recorrente em âmbito mundial .Sem dúvida nenhuma a mesma tendência se evidencia na Itália do século XV, quando ''a oligarquia capitalista genovesa passou das mercadorias para a atividade bancária , e na segunda metade do século XVI , quando os ''nobili vecchi '' genoveses, fornecedores oficiais de empréstimo ao rei da Espanha , retiraram-se gradualmente do comércio . Seguindo os holandeses essa tendência foi reproduzida pelos ingleses no final do século XIX e início do século XX , quando o fim da ''fantástica aventura industrial '' criou um excesso de capital monetário ''(Braudel
ResponderExcluirDepois da igualmente fantástica aventura do chamado ''fordismo-keynesianismo '', o capital dos Estados Unidos tomou rumo semelhante nas décadas de 1970 e 1980 . Mas Braudel não discute a expansão financeira de nossa época,
ResponderExcluirEu sou absolutamente consciente de como é difícil teorizar a transição para a acumulação flexível . Harvey se perguntava se era de fato possível apreender a lógica, senão a necessidade dessa transição . Formulações teóricas passadas e presentes sobre a dinâmica do capitalismo tiveram que ser bastante modificadas. Reorganizações e reestruturações radicais nas forças produtivas e relações sociais forçaram muitos novos dilemas teóricos. Mas estou seguro de que é possível retratar fielmente o atual regime para termos uma idéia melhor do curso e das implicações prováveis do que parece ser uma nova e robusta mudança de paradigma em andamento. Não só a transição do fordismo para a ''acumulação flexível '' , que por si só já trouxe uma avalanche de obstáculos teóricos aparentemente insolúveis pelos meios puramente ''acadêmicos'', mas inclusive a transição ou sub-transição dentro da própria acumulação flexível.
ResponderExcluirK.M.
Já volto.
ResponderExcluirJustamente: minha ''sequência de ciclos sistêmicos '' parcialmente superpostos tem uma estreita semelhança formal com o ''modelo de metamorfose'' do desenvolvimento socioeconômico de Mensch . ESte autor abandona (como eu ) a idéia de que a economia se desenvolveu em ondas , defendendo a teoria de que ela evoluiu por uma série de impulsos intermitentes, que assumem a forma de ciclos sucessivos em forma de S.O modelo menschiano retrata fases de crescimento estável num rumo bem definido, alternando-se com fases de crise, reestruturação e turbulência, que acabam recriando as condições do crescimento estável.
ResponderExcluirK.M
É interessante notar que na síntese de Joshua Goldstein sobre as constatações empíricas e as justificações teóricas dos estudos de ondas longas , a noção de ''capitalismo '' não desempenha papel algum . Ele verifica estatisticamente que as ondas longas dos preços e da produção são basicamente ''explicadas '' pela severidade do que ele chama de ''guerra das grandes potências '' . A questão da relação entre a ascensão do capitalismo e as oscilações dos preços alongo prazo perturbou completamente os estudos dos sistema mundial desde sempre. Nicole Bousquet considerou ''embaraçoso '' que a logística de preços tenha antecedido em muito o ano de 1500. Pela mesma razão, Albert Bergesen perguntou a si mesmo se a logística de preços ''representa a dinâmica do feudalismo ou do capitalismo, ou ambas ''. ''Até a China Imperial parece haver experimentado ciclos do mesmo tipo dos da Europa '' (Hartwell e Skinner). E, mais inquietante do que tudo, Barry Bills e André Gunder Frank sustentaram que '' os ciclos rítmicos e as tendências seculares fundamentais do sistema mundial devem ser reconhecidos como existentes há uns 5 mil anos, em vez dos quinhentos que tem sido convencionado nas abordagens do sistema mundial e das ondas longas ''
ResponderExcluirK.M.
A ligação entre os ciclos seculares de Braudel e aacumulação capitalista de capital não tem um claro fundamento lógico ou histórico. A idéia dos ciclos sistêmicos de acumulação, ao contrário , deriva diretamente da idéia braudeliana do capitalismo como a camada superior ''não especializada '' da hierarquia do mundo do comércio . Nessa camada superior é que se fazem os ''lucros em larga escala ''. Nela os lucros não são grandes apenas porque a camada capitalista ''monopolize '' as atividades econômicas mais lucrativas ; mais importante ainda é o fato de que acamada capitalista tem a flexibilidade necessária para descolar continuamente seus investimentos das atividades econômicas nessa situação (Braudel )
ResponderExcluirK.M.
As expansões financeiras são tomadas como sintomáticas de uma situação em que o investimento da moeda na expansão do comércio e da produção não mais atende, com tanta eficiência quanto as negociações puramente financeiras, ao objetivo de aumentar o fluxo monetário que vai para a camada capitalista. Nessa situação o capital investido no comércio e na produção tende a retornar a sua forma monetária e a se acumular mais diretamente, como na fórmula abreviada de Marx.
ResponderExcluirK.M.
Continuo em outros tópicos mais tarde.
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