Sociólogos, cujo sustento vem de localizar as regras de acordo com as quais a sociedade opera, e tratados sociológicos têm muito gosto em falar sobre regras dos modos mais abstratos, como se as regras sempre fossem claras, sem ambiguidades e seguidas fielmente. No decorrer de uma década de ensino, eu dei câmeras de vídeo nas mãos de meus alunos e pedi para que comprassem um jogo, com regras, nunca jogado antes, e pedi para que filmassem a si próprios, em equipes de quatro, jogando o jogo a partir do momento que abrissem o papel de embrulho que cobria a embalagem até um dos jogadores ter finalmente vencido uma primeira rodada. Em vez de me basear no que a ortodoxia sociológica dizia sobre regras sociais, fiz com que os estudantes vissem repetidamente os videotapes para descobrir exatamente o que era a atividade governada por regras em um jogo atual. Os estudantes descobriram muitos métodos usados pelos jogadores para jogar ordenadamente, mas no decorrer de quarenta de tais jogos nem um só grupo leu todas as regras ou mesmo sabia aquilo que todas as regras exigiam. Mais que isso, as regras que eles não sabiam ganharam sentido não analiticamente, pela leitura e entendimento anterior ao jogo (uma vez que fora das partidas do jogo a maior parte das regras são ininteligíveis), mas reflexivamente, testemunhando-se o que algumas regras realizavam durante uma partida atual do jogo, partida que atribuía às regras a completude de sentido e ordenação que a elas faltavam quando eram meras palavras no manual de instrução. Dessa maneira, uma variedade de temas fenomenológicos – a construção colaborativa de uma unidade de sentido, a reflexividade do entendimento, os processos reais de objetivação e estabilização de sentido durante um decurso temporal etc. – podia ser investigada não como abstrações teóricas mas como fenômenos ocorrendo naturalmente. 7 Tais fenômenos foram capazes de oferecer muito mais complexidade e detalhe sobre questões de interesse fenomenológico do que idealizações sobre regras poderiam fazer. Além disso, enquanto cientistas sociais, temos uma confiança adicional naquilo que identificamos e descrevemos quando se trata de algo derivado do nosso ver fenomenológico atual dirigido para os eventos do mundo real. Nossos achados são consistentes com a descrição de Michael Lynch acerca da diretiva etnometodológica de "dominar as práticas estudadas (em vez de simplesmente aprender a falar 'sobre' elas) e sua desaprovação total de todos os métodos estabelecidos para mapear, codificar, traduzir ou representar diferentemente o raciocínio prático dos membros em termos dos esquemas estabelecidos da ciência social" (1993, p. 274). A força desse programa de pesquisa é deixar os próprios locais nos ensinarem o que precisamos saber em vez de confiar principalmente em nossas explicações finamente verbalizadas.
Idem.
(.)
A doutrina husserliana das origens absolutas. Que tais origens se baseiem somente na experiência do indivíduo, que nós podemos reconhecer a origem absoluta de qualquer coisa, que o sentido se origina na mente e não nos aspectos do mundo enquanto os eventos se desenrolam são todos prejuízos idealistas que devem ser abandonados. Tudo no mundo é derivativo, a racionalidade é somente um dos aspectos da produção de sentido e dificilmente o conhecimento é tão deliberativo em sua construção quanto supõe o modelo de Husserl. E, especialmente, a maior parte dos significados têm seus inícios nas vidas sociais das pessoas, e emergem dessa vida sem o tipo de autoridade que a fenomenologia constitutiva imagina.
Outro estudante de Husserl, Aron Gurwitsch, aprendeu a dar mais prioridade para a intersubjetividade que para a subjetividade: "pode-se dizer que o objeto deriva sua existência e o sentido de sua existência das experiências entrelaçadas e concatenadas intersubjetivamente; e podemos falar da 'constituição intersubjetiva' do mundo, isto é, do mundo enquanto se origina na experiência interligada intersubjetivamente" (1966, p. 432). E Gurwitsch mais tarde chegou a concluir: "é realmente minha convicção que a fenomenologia de Husserl não pode resolver os problemas da intersubjetividade, especialmente aquele da intersubjetividade transcendental, e essa é sua fraqueza" (Grathoff, 1989, p. 230). Embora possamos manter a noção husserliana vital de entendimento originário, a qual tenta preservar o local em que nosso primeiro insight em relação ao sentido, significado e verdade ocorre, precisamos abandonar suas armadilhas metafísicas e reconhecer que toda significação tem seus precedentes, e que muitos desses precedentes ocorrem nas interações sociais naturais das partes que vivem e agem juntas no espaço público. Uma vez que alargamos a sustentação de algumas dessas crenças teóricas a priori e começamos a examinar o próprio mundo na vida cotidiana, encontraremos esses momentos originários da vida inteligível quase em todos os lugares para os quais nos voltarmos...
Idem.
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